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quinta-feira, 26 de abril de 2012

Letramento e Braille


A IMPORTÂNCIA DO CONTATO INICIAL COM A LÍNGUA ESCRITA ATRAVÉS DO SISTEMA BRAILLE

Clarissa de Arruda Nicolaiewsky   - Mestrado em Psicologia – UFRJ

Toda experiência que a criança tem, antes da sua entrada no ambiente educacional, funciona como um "currículo oculto". Assim, quanto maior a experiência que a criança tiver tido com a língua escrita, maior a sua possibilidade de desenvolver a leitura e a escrita com facilidade. Esse contato social com a língua escrita através de, por exemplo, outdoors, rótulos de produtos, livros e revistinhas infantis, é de extrema importância para que se dê o processo de alfabetização. Trabalha-se hoje com o conceito de letramento, enfatizando-se a importância da inserção dos indivíduos nas práticas sociais envolvendo a leitura e escrita (Soares, 1998). Desta forma, aponta-se para a necessidade de se promover o maior contato possível com a leitura e a escrita, dentro e fora da escola, enfatizando sua função social.

No entanto, se uma criança for cega congênita, ela dificilmente  terá contato com a linguagem gráfica existente ao seu redor. São raras as possibilidades de experiência com o Sistema Braille no cotidiano, geralmente reduzidas ao contato com embalagens de produtos farmacêuticos e painéis de elevadores.  Dessa forma, dificilmente a criança cega terá tido acesso ao Sistema Braille antes de entrar na escola (Dodd & Conn, 2000). Além disso, pouca terá sido sua experiência com livros e pessoas que sirvam como modelos de leitores para ela (Lamb, 1996). Tais modelos são fundamentais para a aprendizagem da leitura e da escrita pela criança, pois além de possibilitarem uma compreensão das diferentes funções sociais da escrita, promovem estímulo e interesse pela leitura (Piñero, Quero & Díaz, 2003). As atividades de leitura e escrita realizadas pelos adultos no cotidiano são imitadas naturalmente pelas crianças que enxergam proporcionando-lhes, assim, o interesse pela escrita e o desenvolvimento da representação gráfica, o que não ocorre com a criança cega. Sendo o desenvolvimento da escrita tão importante no mundo atual e tendo a criança deficiente visual um contato mais restrito com a língua escrita, torna-se relevante o estímulo e a promoção de atividades e experiências com o Sistema Braille (Almeida, 2002).

Uma atividade importante para o contato da criança cega com o Sistema Braille é a utilização de livros em Braille onde a criança deve ir "lendo" com o dedo enquanto a história vai sendo contada pelo adulto, sendo que se a criança pára de movimentar o dedo, ele interrompe também a leitura (Nicolaiewsky, 2004). Esta atividade tem como objetivo desenvolver não apenas a compreensão pela criança do princípio alfabético, mas também a própria exploração tátil do Braille, dando função a esta exploração, além de desenvolver a orientação espacial na leitura e na escrita. Os livros podem ser confeccionados transcrevendo ou criando histórias curtas em páginas Braille que podem ser grampeadas no formato de um livro. Outra opção interessante de papel para a confecção dos livros é o uso de encartes de revistas ou jornais produzidos em forma de livretos por possuírem folhas mais grossas até do que a dos papéis utilizados para escrever em Braille. Pode-se, por exemplo, confeccionar um livro em Braille, junto com a criança, onde cada página tem um objeto amarrado referente ao que acontece no texto.

Uma sugestão bastante lúdica é a utilização de cartões em Braille onde podem estar descritas ações sonoras como, por exemplo, bater com os pés no chão, assobiar, estalar os dedos, ranger os dentes etc. Os cartões podem ser colocados dentro de um saco-surpresa e cada criança retira um e trilha a frase com o dedo enquanto a ação é lida para a criança que depois, juntamente com o adulto,  realizam a ação descrita. Uma variação deste jogo é a utilização de cartões com nomes de animais para que sejam imitados os sons que fazem.

Outra possibilidade é a de se utilizar a leitura e a escrita em atividades de faz-de-conta. Por exemplo, podemos brincar com a criança de feirinha, onde ela "lê" a lista do que comprar, isto é, passa o dedo enquanto o adulto lê, e confere a lista, com ajuda, com os produtos encontrados.

Através de atividades como estas, e outras que possamos realizar juntamente com a criança, é possível proporcionar a criança cega um contato inicial com o Sistema Braille de forma que ela possa compreender a função da escrita e, desta forma, desenvolver curiosidade e interesse por seu aprendizado.

Referências

Almeida, M. G. (2002). Fundamentos da alfabetização: uma construção sobre quatro pilares. Revista Benjamin Constant, 22 (8): 13-21.

Dodd, B. & Conn, L. (2000). The effect of Braille orthography on blind children's Phonological Awareness. Journal of Research in Reading. vol. 23(1): 1-11.

Lamb, G. (1996). Beginning Braille: A whole language-based strategy. Journal of Visual Impairment and Blindness. vol. 90 (3): 184-189.

Nicolaiewsky, C. (2004).  O Desenvolvimento de competências metalingüísticas e o aprendizado da escrita através do Sistema Braille. Monografia. Instituto de Psicologia. Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Pinero, D., Quero, F. & Diaz, F. (2003). O Sistema Braille. Em M. Martín & S. Bueno (coords). Deficiência visual: aspectos psicoevolutivos e educativos. (pp. 227-248). São Paulo: Livraria Santos Editora Ltda.

Soares, M. (1998). Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica.

Está na Rede

Instituto Benjamin Constant
Sítio do Instituto Benjamin Constant, referência nacional em educação e atendimento a deficientes visuais.

Almeida, M. G. (2002). Fundamentos da alfabetização: uma construção sobre quatro pilares.    Revista Benjamin Constant, 22 (8): 13-21.

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